Gilberto Gil em Brasília: uma despedida que vai além do tempo

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No sábado, 7 de junho, o Estádio Mané Garrincha, em Brasília, foi palco de uma noite histórica. Milhares de pessoas foram á Capital Federal assistir à turnê de despedida Tempo Rei, de Gilberto Gil — um dos ícones da música brasileira no século XX e início do XXI. Se Goiânia ficou fora do roteiro, Brasília, por algumas horas, tornou-se casa comum para quem não quis perder a chance de ver de perto um dos maiores arquitetos sonoros do país.

Gil entrou no palco com  vigor de quem ainda reinventa a própria lenda. No palco, ao lado de filhos,  netos e nora, presenças recorrentes nesta turnê , o baiano transformou o espetáculo num gesto coletivo de celebração e afeto. A abertura com Palco foi um aceno claro ao seu desejo de permanecer onde sempre esteve: no centro da experiência musical brasileira.

Músicas como Expresso 2222, Back in Bahia e Eu só quero um xodó, interpretadas com o auxílio luxuoso da sanfona de Mestrinho, reafirmaram a vitalidade rítmica de Gil e sua capacidade de fundir tradição e modernidade, festa e reflexão. No ponto alto do concerto, a emblemática Cálice, com introdução em vídeo de Chico Buarque, foi recebida por gritos de “sem anistia”.  

Gilberto Gil e Alexandre Carlo | Foto: Gyovana Carneiro

Com o estádio completamente lotado, o que se viu foi um espetáculo de múltiplas camadas: musical, histórica, emocional. A participação de Alexandre Carlo, da banda Natiruts, em Filho da Terra foi simbólica, como se Gil passasse o bastão a outras vozes negras e conscientes que continuam moldando a canção popular brasileira. Em Não chores mais (versão de No woman no cry), o encontro entre a diáspora africana e a esperança brasileira ganhou contornos litúrgicos: o público cantava como se tentasse conjurar dias melhores.

A segunda metade do espetáculo foi marcada por um clima mais íntimo, quase camerístico, com canções como Drão, Estrela e Se eu quiser falar com Deus interpretadas em voz e violão. Nesse formato despojado, emergiu o Gil filósofo, o poeta, o homem que se despede sem partir.

“O amor é mais difícil que a morte” 

Refletiu em voz calma, como quem compartilha uma lição última. Ao final, entre o forró e o axé, Gil dançou. Dançou como se o tempo estivesse suspenso, como se a despedida fosse apenas mais um modo de permanecer. O público, em transe coletivo, respondeu à altura,  com gritos, com lágrimas, com amor. O abraço final, físico e simbólico, selou uma noite que escapa das palavras.

Gilberto Gil em Brasília | Foto: Divulgação

Gilberto Gil não se despede apenas de Brasília. Ele se despede de uma era. Mas o que vimos no Mané Garrincha foi menos uma retirada e mais uma consagração. Porque artistas como ele não saem de cena, eles se integram ao nosso imaginário de forma permanente. O tempo pode passar. Gil, não. Ele já é.

Para continuar em sintonia com essa despedida que não termina, vale a pena ouvir Drão em uma gravação especial disponível no YouTube. A canção integra a trilha sonora de Em Casa com os Gil, reality original do PrimeVideoBR, que em sua primeira temporada reuniu a família Gil em sua casa na serra. A docussérie, produzida pela Conspiração Filmes, documenta não apenas o cotidiano afetivo e musical da família, mas também a transmissão de um legado entre gerações.

Nessa gravação, Gil divide o momento com sua filha Preta Gil, em uma das interpretações mais comoventes da série. Ao lado do pai, visivelmente emocionada, Preta empresta sua voz e sua presença a uma canção que fala de amor, ruptura e transcendência. O diálogo musical entre os dois ganha uma profundidade tocante, especialmente considerando os desafios recentes de saúde enfrentados por ela.

Observe a suavidade com que Gil articula cada palavra,  há um tempo largo, quase meditativo, que realça a densidade emocional da letra. O arranjo é delicado, com o violão criando uma base harmônica discreta, enquanto a voz de Preta se entrelaça à do pai com respeito e afeto. A imagem da família ao fundo, escutando ou acompanhando discretamente com o instrumental, reforça o sentido de continuidade. Drão é, ali, mais do que uma canção: é um testemunho vivo de afeto, resiliência e memória.

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Fonte: Jornal Opção

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