O desabamento de parte do lixão de Padre Bernardo, ocorrido na última quarta-feira, 18, expôs os riscos ambientais que há anos vinham sendo apontados por órgãos de fiscalização e a disputa judicial que manteve o local em funcionamento, apesar das irregularidades. Mesmo após uma perícia judicial, o aterro seguiu operando até ser finalmente embargado pela Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás (Semad) na quinta-feira, 19. Todas as tentativas anteriores de interdição haviam sido revertidas por decisões judiciais, permitindo a continuidade das atividades em desacordo com as normas ambientais.
Segundo levantamento feito pelo Jornal Opção, a empresa responsável pela gestão do aterro, o Aterro Ouro Verde, possui uma área total de 760 mil metros quadrados, com capacidade para receber até 8.130.000 toneladas de resíduos ao longo de uma vida útil prevista para 13 anos e 4 meses. O funcionamento do empreendimento começou em 2016, e, desde então, a Semad identificou uma série de irregularidades, incluindo a ausência de licença ambiental válida e o descarte inadequado de resíduos.
Em entrevista ao Jornal Opção nesta sexta-feira, 20, a secretária Andréa Vulcanis anunciou que a Semad formalizou o embargo do empreendimento, impedindo a entrada de novos resíduos. “A empresa foi notificada para apresentar um plano de contingência para poder fazer a remediação. É complexo, a pilha está instável, então eles vão ter que estabilizar a pilha e depois fazer o recolhimento dessa parte que desabou. Nós estamos aguardando eles apresentarem isso”, afirmou.
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Segundo a titular da Semad, a situação exige um trabalho técnico detalhado. “Nós demos um prazo para que eles entreguem, certamente tem que fazer isso com engenheiros para identificar qual que vai ser a medida aplicada ali para dar segurança tanto para o meio ambiente quanto para as pessoas”, destacou.
Andréa também confirmou que a equipe da secretaria permanece no campo para a realização de levantamentos. “As nossas equipes estão em campo, eles fizeram ontem os primeiros levantamentos para determinar o volume de material que foi desabado e também a parte de qualidade da água”, explicou.
Os próximos passos incluem análises laboratoriais para identificar até onde a pluma de contaminação se espalhou pelas águas da região. Um relatório preliminar com os primeiros diagnósticos deve ser divulgado nos próximos 10 a 15 dias. “É um impacto sistêmico, isso se alonga aí por muitos anos, mas tudo isso está sendo elaborado aí”, finalizou.
Mesmo diante de sete autos de infração e múltiplos embargos administrativos, o lixão continuou funcionando amparado por liminares concedidas pela Justiça Federal e pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO). A Semad, o Ministério Público de Goiás (MP-GO) e o Ministério Público Federal (MPF) atuaram ao longo desses anos tentando impedir a continuidade da operação, que sempre ocorreu sem os estudos ambientais obrigatórios e dentro de uma área de preservação permanente.
O histórico de sanções é extenso e começou ainda em dezembro de 2016, quando a primeira multa foi aplicada por operação sem licença ambiental. Em novembro de 2021, duas novas autuações apontaram problemas como a disposição incorreta de resíduos e o descumprimento de condicionantes. Esses fatos resultaram em novas multas.
Semad determina embargo de aterro
Na tarde de quinta-feira, 19, a secretária estadual de Meio Ambiente, Andréa Vulcanis, esteve no local do desabamento para avaliar os impactos. Durante a vistoria, ela confirmou que centenas de toneladas de lixo deslizaram até o Rio do Sal, provocando graves danos ambientais.
“A sensação aqui é de indignação. Seguimos com todas as medidas administrativas e judiciais para impedir que isso continue acontecendo”, declarou. A secretária também ressaltou que o episódio era previsível. “Isso aqui era uma tragédia anunciada, que já havíamos informado e demonstrado ao Poder Judiciário”, afirmou, destacando ainda que um córrego da região foi contaminado, tornando a água imprópria tanto para consumo humano quanto para uso na agricultura.
Já em junho de 2022, a Semad determinou um embargo total das atividades, mas a empresa continuou operando após reverter a decisão na Justiça. Em julho de 2023, a situação se repetiu: a empresa foi novamente multada por ignorar o embargo anterior. E, em 2024, outras duas penalidades foram emitidas, consolidando um padrão de reincidência das infrações.
Além dos danos diretos ao meio ambiente, o desabamento expôs a fragilidade estrutural da pilha de resíduos. Segundo a secretária Municipal de Meio Ambiente de Padre Bernardo, Daiana Monteiro Cavalcante, uma perícia judicial já havia sido realizada no local antes do acidente. “Aparentemente esse deslizamento foi um erro operacional. Uma perícia já foi feita no local e não teve nenhuma ação depois, nós aqui não tivemos acesso a essa perícia porque essas informações técnicas e operacionais estão com a parte jurídica que está avaliando sobre. A perícia foi concluída no mês de março com o perito judicial do processo federal vindo no local e avaliando”, explicou.
A situação levou as autoridades locais a adotar medidas emergenciais. Daiana informou que as equipes da prefeitura estão acompanhando o caso desde o início. “Estamos aqui no local desde cedo, e estamos acompanhando de perto desde quarta-feira, cobrando os órgãos e hoje vamos visitar a comunidade, avisando e alertando”, ressaltou.
O que diz a prefeitura de Padre Bernardo
O prefeito de Padre Bernardo, Joseleide Lázaro (UB), também comentou a situação em entrevista ao Jornal Opção. Ele destacou que o município não tem competência direta para autorizar ou fiscalizar empreendimentos de alto impacto ambiental. “Quem autoriza e fiscaliza empreendimentos de alto nível de poluição ambiental é a Semad e essa autorização para o lixão funcionar mediante decisão judicial, cabe ao poder Judiciário justificar os motivos dessa liberação. A nossa equipe está no local fazendo as cobranças e as notificações necessárias”, declarou.
A Prefeitura de Padre Bernardo também se pronunciou oficialmente por meio de nota. No documento, a administração municipal reforçou o compromisso com a proteção ambiental e detalhou as ações já adotadas. “Diante do desabamento de talude no Aterro Sanitário Ouro Verde, a Prefeitura de Padre Bernardo informa que já adotou as providências cabíveis, oficiando imediatamente os órgãos estaduais e federais competentes para que sejam tomadas as medidas necessárias com máxima urgência”, afirmou o comunicado.
O texto ainda reforça o papel da Semad como órgão responsável pela fiscalização do aterro. “A Secretaria Municipal de Meio Ambiente encaminhou solicitação formal à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), órgão responsável pela fiscalização de aterro sanitário, requerendo a atuação do órgão na fiscalização e adoção de providências legais para mitigar qualquer impacto ambiental e social decorrente da possível instabilidade do aterro”, destacou a nota.
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