Apesar do avanço significativo na realização de transplantes, o Estado de Goiás ainda lida com um obstáculo persistente: a alta taxa de recusa familiar à doação de órgãos, que chega a 68%, acima da média nacional. Gerente da Central Estadual de Transplantes da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO), Katiuscia Freitas, diz ao Jornal Opção que esse é um dos principais desafios do sistema, apesar do esforço contínuo para ampliar o número de doares e reduzir as fila de espera.
Leia também: Mais de 120 goianos já registraram intenção de doar órgãos por meio de certificado digital; saiba como fazer
“A gente depende principalmente da autorização da família. A família pode rejeitar essa doação, independente de haver um documento em que a pessoa fale que é doadora”, explica Freitas. Segundo ela, mesmo com o registro eletrônico de doador de órgãos, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), depende da confirmação familiar. “Faz diferença quando uma pessoa chega em casa e diz que fez o registro para ser doador”.

Para enfrentar a resistência das famílias, o estado tem investido fortemente na capacitação de profissionais da saúde. “É um desafio muito grande falar de morte em casa. Ninguém quer falar sobre isso”, admite. Até maio deste ano, mais de 800 profissionais foram treinados em 31 comissões intra-hospitalares, que atuam diretamente no acolhimento das famílias.
“Entre os principais motivos de rejeição estão o desejo da família de manter o corpo íntegro, a percepção de que o falecido não era doador e o tempo necessário para o procedimento”, comenta. Ela argumenta, no entanto, que os procedimentos não prejudicam a integridade do corpo.
Número de procedimentos
Goiás registrou um crescimento de 62% nos transplantes nos últimos três anos. Foram 553 procedimentos em 2022 contra 895 em 2024. Rim e córnea são os órgãos mais transplantados, e também os que concentram as maiores filas de espera.
Atualmente, aguardam um transplante no estado 1.705 pessoas para córneas e 691 para rim. Há ainda sete pacientes na fila para fígado e um para pâncreas, totalizando cerca de 2.400 pessoas.
HGG referência
O Hospital Estadual Dr. Alberto Rassi (HGG) é o principal centro transplantador de Goiás, responsável por 98% dos transplantes renais. “Temos credenciados como a Santa Casa e o Hospital de Clínicas, mas eles não estão realizando os procedimentos. A maior parte é feita pelo SUS”, pontua Freitas.
Goiás ainda não realiza transplantes de coração e pulmão, mas participa da captação desses órgãos. “Outros estados vêm para fazer a captação de receptores selecionados. Coração é sempre São Paulo e DF pela logística. Eles captam quando temos doadores.”
Leia também: Goiás registra aumento de 65% em transplantes de órgãos nos últimos cinco anos, aponta SES
Apesar da centralização, a lista de espera é nacional, embora regionalizada. “Inicialmente, a gente vai atender os receptores de Goiás. Se não tem, aí a gente oferece para receptores de outros estados”, explica a gerente.
A tecnologia também tem papel essencial nesse processo. Goiás já utiliza a prova cruzada virtual, que avalia a compatibilidade genética entre doador e receptor, identificando a chance de rejeição. “Temos inclusive uma tecnologia para realizar a prova biológica, com exame de citometria de fluxo, que analisa múltiplas características das células.”
Tempo de espera
O tempo de espera por um órgão varia: cerca de 15 meses para rim, seis meses para fígado e até 22 meses para córneas, que seguem ordem cronológica. Contudo, Freitas lembra que “o transplante é por compatibilidade. Tem pessoas que vão ficar um mês na lista, outras dois anos.”
Leia também: Superando recusa familiar, Goiás registra 110 doações de órgãos em 2024
Brasil realizou mais de 30 mil procedimentos
O Ministério da Saúde divulgou nesta quarta-feira, 4, que o Brasil ultrapassou, pela primeira vez, a marca de 30 mil transplantes em um único ano. Foram 30.300 procedimentos realizados em 2024, sendo 85% deles pelo SUS, que destinou R$ 1,47 bilhão à área — um aumento de 28% em relação a 2022.
Os órgãos mais transplantados foram córnea (17.107), rim (6.320), fígado (2.454) e medula óssea (3.743). Ainda assim, a fila nacional conta com cerca de 78 mil pessoas, sendo mais de 42 mil à espera de um rim.
O Brasil enfrenta, como Goiás, o desafio da recusa familiar: apenas 55% das famílias abordadas aceitaram doar os órgãos de seus entes. Como resposta, o governo federal anunciou o Programa de Qualidade em Doação para Transplante (PRODOT), que qualificará e monitorará as equipes de entrevista familiar em parceria com a Associação de Medicina Intensiva Brasileira.
Leia também:
Transplantes de órgãos e tecidos avançam 46% em Goiás
O post Goiás avança em transplantes, mas enfrenta 68% de recusa familiar à doação de órgãos apareceu primeiro em Jornal Opção.